No dia 29 de Maio, durante a aula de Língua Portuguesa, a professora Dulce fez-nos uma surpresa.
Convidou, sem que nós déssemos por nada, os nossos encarregados de educação, para virem à nossa aula ler uns poemas.
A professora teve esta ideia, porque nos propôs a leitura de poemas para os nossos pais, e uma vez que recusámos, por vergonha, ela decidiu incentivar-nos desta forma tão original!
Ficámos bastante surpreendidos, pois não estávamos nada à espera.
Apenas quatro encarregados de educação tiveram disponibilidade de comparecer, mas já foi o suficiente para nos deixarem sem palavras, com os bonitos poemas que nos trouxeram.
Os poemas foram:
Lágrima de Preta – António Gedeão
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.
Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.
Poema da Morte na Estrada – António Gedeão
Na berma da estrada, nuns quinhentos metros,
estão quinhentos mortos com os olhos abertos.
A morte, num sopro, colheu-os aos molhos.
Nem tiveram tempo para fechar os olhos.
Eles bem sabiam dos bancos da escola
como os homens dignos sucumbem na guerra.
Lá saber, sabiam.
A mão firme empunhando a espada ou a pistola,
morrendo sem ceder nem um palmo de terra.
Pois é.
Mas veio de lá a bomba, fulgurante como mil sóis,
não lhes deu tempo para serem heróis.
Eles bem sabiam que o último pensamento
devia estar reservado para a pátria amada.
Lá saber, sabiam.
Mas veio de lá a bomba e destruiu tudo num só momento.
Não lhes deu tempo para pensar em nada.
Agora,
na berma da estrada, nuns quinhentos metros,
são quinhentos mortos com os olhos abertos.
Liberdade – Fernando PessoaAi que prazerNão cumprir um dever,Ter um livro para lerE não o fazer!Ler é maçada,Estudar é nada.O sol doiraSem literatura. O rio corre, bem ou mal,Sem edição original.E a brisa, essa,De tão naturalmente matinal,Como tem tempo não tem pressa... Livros são papéis pintados com tinta.Estudar é uma coisa em que está indistintaA distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto é melhor, quando há bruma,Esperar por D. Sebastião,Quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças...Mas o melhor do mundo são as crianças,Flores, música, o luar, e o sol, que pecaSó quando, em vez de criar, seca. O mais do que istoÉ Jesus Cristo,Que não sabia nada de finançasNem consta que tivesse biblioteca...
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